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maio 2014

Fraude ou erro no reconhecimento da receita?

Normatizado pela Resolução CFC 1.412/2012, cuja base assenta-se no Pronunciamento Técnico CPC 30 (R1) (International Accounting Standards – IAS 18 do International Accounting Standards Board – IASB), o reconhecimento da receita tem sido pródigo em gerar casos emblemáticos que se posicionam em um limbo entre a fraude e o erro.

No passado recente, o país registrou diversos casos de ambos os tipos e muitos despertaram as atenções, alguns deles por envolver empresas importantes para o mercado e, fundamentalmente, surgidas do esforço de grandes empreendedores. Mas é certo, no entanto, que todas as ocorrências do gênero merecem um estudo mais aprofundado, independentemente de suas origens e causas. A TAM Linhas Aéreas, e o então Banco PanAmericano – hoje Banco Pan –são apenas dois deles.

Em 2012, a TAM apresentou erros na contabilização de passagens que mudaram completamente suas demonstrações contábeis do exercício. Em uma reapresentação das demonstrações contábeis daquele ano, o patrimônio líquido da empresa ficou negativo (passivo a descoberto) em R$ 901 milhões. Este fato significa que as dívidas e compromissos financeiros superavam seus ativos no período. No balanço original, o patrimônio era de R$ 532 milhões.

O problema ocorreu no modo como eram reconhecidas as receitas com passagens antecipadas – aquelas que foram emitidas, mas ainda não utilizadas –, que geraram um ajuste negativo de R$ 1,1 bilhão.

A administração da TAM atribuiu tal erro à fragilidade do sistema de controles internos no reconhecimento da receita, problema sanado no exercício de 2012.

O próprio texto da Resolução CFC nº 1.412/2012 explica com nitidez que falha foi cometida: … na venda de ingressos em eventos, as receitas provenientes de apresentações artísticas, banquetes e outros eventos especiais devem ser reconhecidas quando o evento ocorrer. Quando os ingressos para uma série de eventos forem vendidos, a comissão deve ser alocada a cada evento em base que reflita a extensão em que os serviços são prestados para cada evento.

Para ilustrar o erro existente nas demonstrações contábeis da TAM, note-se que as notas explicativas da GOL (sua concorrente direta no mercado brasileiro) ,em 31 de dezembro de 2012, reconhecem a receita proveniente de passagens quando o transporte aéreo é efetivamente prestado.

Os bilhetes vendidos, mas ainda não utilizados, são registrados como transportes a executar, representando, portanto, uma receita antecipada (adiantamento de clientes) de bilhetes vendidos a serem transportados em data futura, líquido dos bilhetes que expirarão de acordo com a expectativa da companhia, considerando dados históricos.

Não se pretende aqui, evidentemente, julgar se houve erro ou fraude nas demonstrações financeiras originais da companhia aérea, até porque não conhecemos com detalhes o que ocorreu, mas apenas mostrar o quanto é complexo o reconhecimento das receitas, ou seja, o momento exato em que elas se concretizam, algo que deve ser estabelecido sempre de forma clara e inequívoca, conforme ensina este episódio emblemático.

O caso da TAM revela erros que aparentemente não decorrem de fraude na contabilidade, mas sim de deficiências de controle interno, sem o conhecimento dos seus contadores e auditores sobre a interpretação das normas contábeis à luz daquelas operações, o que acabou gerando efeitos relevantes nos resultados demonstrados.

Mas quando analisamos as fraudes contábeis genuínas, invariavelmente a receita também é uma das áreas mais afetadas. Chamam a atenção neste campo problemas como o ocorrido com o então Banco PanAmericano, que inflava seus balanços por meio do registro de carteiras de créditos que haviam sido vendidas a outras instituições como parte de seu patrimônio.

Este subterfúgio permitiu à instituição que o valor da empresa fosse incrementado antes da abertura de seu capital, em novembro de 2007, conforme reportagem especial publicada no site da revista Veja(http://veja.abril.com.br/tema/panamericano).

Outro exemplo generalizado no Brasil de incongruência nesta área é o reconhecimento da receita proveniente da venda de mercadorias e produtos pela emissão de notas fiscais, ignorando com isso a necessidade de se satisfazerem algumas condições.

A primeira delas remete ao momento em que a entidade transfere para o comprador os riscos e benefícios mais significativos inerentes à propriedade, gestão e controle dos bens.

As demais condições exigidas são que: o valor da receita possa ser mensurado com confiabilidade; os benefícios econômicos associados à transação fluam para a entidade; e as despesas incorridas ou a serem incorridas, referentes à transação, possam ser mensuradas de forma igualmente confiável.

É evidente que a mera emissão da nota fiscal não pode ser reconhecida como receita. Ao agir dessa forma, não se adota nem regime de competência nem de caixa, além de contrariar frontalmente a estrutura conceitual da contabilidade contemporânea, isto é, a essência deve sempre prevalecer sobre a forma.

Fica ainda como lição disso tudo a necessidade de que contadores e auditores tenham pleno entendimento do sistema de controle interno das empresas que atendem, identificando as fraquezas e reportando-as no devido tempo para que se evitem distorções como as aqui rememoradas. Afinal, a contabilidade internacional trouxe novos desafios para a elaboração das demonstrações contábeis, tornando a governança corporativa ferramenta imprescindível.

O mesmo raciocínio estende-se à esfera da auditoria independente. Após iniciar um trabalho do gênero, este profissional deve realizar todos os procedimentos possíveis e necessários, suficientes para fundamentar sua opinião. Do contrário, não tem como identificar, com clareza, todas as fraquezas que passíveis de originar erros ou fraudes, deixando brechas que poderão, mais cedo ou mais tarde, motivar casos de manipulação que não deixariam margem sequer ao beneficio da dúvida suscitada no título deste artigo texto.

(*) Marco Antonio Papini é sócio-diretor da Map Auditores Independentes e vice-presidente da CPAAI Latin America.

 

FONTE: Portal contabeis

Questão tributária divide atacadistas tradicionais e ‘atacarejos’ no País

O setor atacadista brasileiro está dividido. Durante o encontro anual da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (Abad), que reuniu representantes de empresas e associações em São Paulo, um tema foi tratado com cautela entre os empresários: a criação de uma nova entidade, liderada por executivos dos chamados ‘atacarejos’, que vendem também para o consumidor final e alegam não ser representados pela associação nacional, cujos principais membros são os atacadistas tradicionais.

O impasse começou no fim do ano passado, quando a nova gestão da Abad, presidida por José do Egito Frota Lopes Filho, diretor comercial da Jotujé Distribuidora, levantou como uma de suas bandeiras a questão tributária. Uma das propostas é tornar obrigatória a identificação do comprador do atacarejo, com a inclusão do CPF dele na nota fiscal. Hoje, estabelecimentos desse tipo, como o Atacadão, do grupo Carrefour, ou Assaí, do Grupo Pão de Açúcar, vendem tanto para empresas quanto para o consumidor final e, nesse último caso, a identificação não é obrigatória. Já nos atacados tradicionais, a venda só pode ser feita com a informação do CNPJ da empresa.

“O atacarejo não está errado. Eles fazem tudo conforme a lei, mas o microempresário, que está inserido no Simples, pode se aproveitar dessa diferença de modelos para não ser tributado”, diz José do Egito. O que ele quer dizer é o seguinte: para ser inserida no Simples – e assim pagar menos imposto – a empresa tem de faturar no máximo R$ 3,6 milhões por ano. Quando o dono do mercadinho ou do restaurante supera o limite de compras do mês no atacado tradicional, ele tem a opção de comprar no atacarejo emitindo apenas cupom fiscal. “Sem a exigência do CPF no cupom fiscal, a Receita Federal não consegue identificar essa compra.”

O tema gerou polêmica no setor. Em entrevista à revista Distribuição no mês passado, o empresário Luiz Antônio Tonin, do Grupo Tonin – dono de sete atacarejos, quatro supermercados e um atacado distribuidor – disse que considera a medida um erro. “Uma pessoa pode comprar com o CPF de outra, por exemplo”, afirmou. “Seria mais um encargo em cima do atacadista e do varejista, sendo que as secretarias da fazenda já têm instrumentos suficientes de controle de arrecadação.”

Com 20 lojas em São Paulo, o Tenda Atacado também se posicionou contra a proposta. O presidente do grupo, Carlos Eduardo Severini, afirmou, na mesma ocasião, que essa é uma “medida retrógrada” que, se aprovada, vai dificultar compras simples.

Para que essa mudança passe a vigorar no País, o setor atacadista teria de convencer as Secretarias de Fazenda estaduais de que ela vale a pena. Hoje, apenas dois Estados exigem a identificação de CPF e CNPJ na nota fiscal: no Rio Grande do Sul, desde 2012, e em Sergipe, desde julho de 2013.

Associação. O debate acabou motivando um grupo de atacarejos a articular a criação de uma nova entidade, que ainda está em fase de gestação. À frente desse movimento, estão o presidente do Roldão Atacadista, Ricardo Roldão, o presidente do Atacadão Roberto Mussnich e o presidente do Spani Atacadista, Cleber Gomez. Nenhum deles concedeu entrevista, mas suas assessorias de imprensa confirmaram as conversas para a criação da Associação Brasileira dos Atacadistas de Autosserviço (Abaas).

Na Abad, ontem, o assunto causou certo constrangimento. “Não fomos informados sobre uma nova associação”, disse José do Egito. “O clima é de conciliação.”

Ele e outros atacadistas preferiram concentrar o debate em um pleito mais consensual no setor e mais próximo de se concretizar, que é o aumento do teto de faturamento para que micro e pequenas empresas sejam enquadradas no Simples. A proposta do setor é de que esse limite passe de R$ 3,6 milhões ao ano para R$ 6 milhões. Em outubro do ano passado, uma frente parlamentar foi criada para tratar dos assuntos de interesse do setor em Brasília.

O teto proposto pelos atacadistas está longe de ser aprovado, mas hoje será votado no plenário da Câmara dos Deputados um projeto de lei que eleva de R$ 3,6 milhões para R$ 4,3 milhões o limite para adesão ao programa. “Já será um avanço para esse segmento”, diz o deputado Antonio Balhmann, que preside a frente parlamentar.

 

Fonte: Estadão